segunda-feira, 4 de maio de 2009

A carta que fez Carla desistir de casar

Fiquei sabendo ontem à tarde do seu casamento. Lembra da dona Zélia, aquela velha que gosta de anunciar tragédias? Pois é, foi aquela mala quem me contou. Estava saindo da casa da minha mãe e ela, a velha, chegou tão vermelha e excitada que achei que ia cair durinha na minha frente.

Então, ela parou, tomou fôlego, olhou bem na minha cara, deu uma geral nas minhas roupas, coisa bem característica dela, e falou: “E aí, Pedro, tudo bem?” Falou só para mostrar um mínimo de educação. Eu disse o meu “tudo bem” e fui saindo para manter a devida distância sanitária. Aí, veio ela quase jogando seus peitos na minha barriga: “Tá sabendo da Carla?”

Confesso que me faltou o chão na hora, mas não perdi a pose. Tentei fazer de desentendido. Dei uma gaguejada no seu nome e não saí do lugar. “A Ca-carla?” “É, ela vai casar sábado.” Não quis perguntar com quem porque eu já sabia e não queria que a dona Zélia esticasse mais a conversa.

Por mais que eu tenha me esforçado, com certeza, a velha notou o meu desapontamento. Ela ficou me olhando com um sorriso vitorioso depois de cumprir mais um importante compromisso na sua vida de sanguessuga. Na falta de ter suas próprias dores, amores e humores, ela se apossa das dos outros.

Saí dali, entrei no carro. Aquele movimento espontâneo com a mão direita para ligar o rádio não aconteceu. Dirigi sem pensar no trânsito. Tive que enxugar as lágrimas várias vezes porque estavam atrapalhando minha visão. E eu que pensava que a gente nem tinha terminado...

Achava que você não ia dar trela pra aquele moleque do Jeferson. No fim das contas, olha só, eu me achando o máximo e o garoto chegando, chegando e eu saindo da sua vida.

Saí do carro, parei no bar do Roque. Aquela turma de sempre estava lá, aquele povo que você conhece, o Nelson, o Vadão e o Paulo da eletrônica. Pedi uma cerveja, disfarcei, mas perceberam na hora. Perguntaram se algum parente tinha morrido, se eu tinha perdido o emprego ou se era alguma coisa com você.

Não me controlei, caí no choro de novo e falei tudo. Chorava, babava e bebia. Nem te conto o que os caras disseram de você. “Esta mulher não te merece, Pedrão”. “Como é que ela faz isso com um cara decente como você?” “Bem feito. Você fazia tudo por ela.” E falaram mais coisas que eu não tenho a coragem de dizer.

São 10 da manhã desta triste quinta-feira. Não fui trabalhar. Acordei agora pouco e resolvi te escrever. Minha cabeça está doendo e o meu coração sangrando. Nem sei como terminar esta carta. Acho que não tem fim. Nossa história também não.

(Antonio Roberto de Paula - Texto publicado no jornal O Diário do Norte do Paraná, dia 30 de setembro de 2007)

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