O Deus daquela igreja parece maior do que o da minha, mais forte e poderoso. Os milagres de lá devem ser mais completos do que os de cá. Acho que a salvação de lá é mais completa. Imagino que lá os pecados são todos perdoados. A alma se transforma em puro linho branco. Os meus irmãos daquele lado têm a alma alva e o espírito iluminado. Devem ter obtido a senha para chegar ao céu. Já estão no paraíso enquanto fazem um pitstop na terra.
Aqui, neste canto, fico preocupado em saber a quantas anda minhas possibilidades de ser salvo. Pergunto se entrei na igreja certa. Tive tantas escolhas depois de moço, tantas chances de me encontrar e outras tantas para me perder. Tive motivações e desânimos, e nesta soma restou um olhar interrogativo.
Passaram verões, invernos e estações gerais, vieram feridas e cicatrizes, cortes leves que a manhã seguinte curou, cortes profundos que o cair da noite intensificou, sons providenciais e silêncios apavorantes. E passam os dias pelo vão dos dedos. Velozes dias, as horas não podem ser controladas e a impotência para mudar torna a angústia mais poderosa. Então vou para dentro de mim, me enxergar entre o turbilhão e a calmaria.
Agora estou numa igreja onde parece reinar a paz. Aqui as pessoas sentam-se comportadas, viram o rosto lentamente, murmuram orações com os dedos cruzados. Todos tão serenos ou só estão fazendo de conta? No interior delas, tempestades podem estar em formação ou prontas a irromper. Tiro o olhar dos outros e me concentro no altar, no homem cingido por Deus para ser o condutor das ovelhas unidas, perdidas e desgarradas.
Então, ele levanta os braços e com a voz transbordante de amor e fé, o representante divino, com procuração atualizada para me salvar, pelo menos é o que acho, diz palavras reconfortantes, animadoras. Meu envolvimento é tal que nos próximos segundos vou acreditar nas suas versões sobre harmonia terrena e salvação eterna. Mas logo começo a duvidar dele e da minha capacidade de entrar no seleto grupo da serenidade.
São muitas as portas e são muitas as dúvidas. Mas quero participar. De pé, mãos para cima, com os olhos fechados e a boca aberta entoando o refrão de um salmo, entro numa fase catártica e sinto que o meu corpo e alma estão sendo purificados.
O homem de Deus consegue me transportar para o campo das ovelhas unidas, daquelas que compreendem. Para a voz, para o cântico, ovelhas dispersando-se. E eu, desgarrado, de volta para a rua. Vêm as horas sem controle, a angústia comportada. Como será que a gente consegue a tal senha?
(Antonio Roberto de Paula - Texto publicado no jornal O Diário do Norte do Paraná, dia 9 de março de 2008)
Um comentário:
Olá de Paula. Sumiu de O Diário? Estou sentindo falta de suas crônicas dominicais, que exalam prosa e poesia! Um abraço.
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