terça-feira, 29 de janeiro de 2008

Sagrados pioneiros



Maringá prima pela valorização de seus pioneiros.
A cidade é jovem e, por isso, muitos dos que chegaram nas décadas de 40 e 50 estão vivos e constantemente são homenageados pelo poder público e entidades.

Na maior parte das publicações há um indisfarçável interesse em romancear a história da Cidade Canção. Nos relatos, a máxima de César – Vini, vidi, vici (vim, vi, venci) – serve como modelo para contar a saga dos pioneiros.

Os embates políticos são retratados, em sua maioria, de forma novelesca, como se todos lutassem pelo desenvolvimento da cidade com desprendimento, apenas pelo ideal de servir à comunidade e não para o ganho e satisfação pessoais.

Nos depoimentos dos pioneiros não se verificam críticas contundentes à administração municipal, Câmara de Vereadores e a outros setores.

A atuação da Companhia de Terras, que passou a se chamar Companhia Melhoramentos Norte do Paraná, parece não merecer reparos. Os relatos convergem quase sempre para um único ponto: o da vitória com luta e garra. Certamente influenciados pelo mascaramento das informações históricas do Brasil até meados da década de 80, os historiadores fizeram de Maringá um lugar em que imperava a harmonia.

Pelo que se ouve e lê, os homens trabalhavam duro, mas com o semblante feliz e entoando a cantiga Maringá, de Joubert de Carvalho.

Esta visão distorcida de Maringá não pode ser debitada apenas a quem escreveu a história e a professores, estudantes, jornalistas e outros curiosos que hoje a reescrevem.

Para não ferir suscetibilidades, destinar críticas a quem não pode mais respondê-las e para não se vangloriar sob pena de tripudiar o fracasso de outros, os próprios pioneiros se encarregam de manter o mito da cidade formada em completa harmonia. Os filhos e netos mantêm esta chama viva. Os poetas caminham juntos neste objetivo.

Desfigurando a realidade, não são tomados depoimentos daqueles que vieram a Maringá e não prosperaram. E convenhamos, é difícil obter estas declarações. Também não foram divulgados registros daqueles que tiveram que devolver seus lotes à Companhia de Terras por falta de pagamento.

Torna-se impossível chegar a um número de famílias que não se adaptaram e foram tentar a sorte em outras regiões, dos que empobreceram, faliram, dos que morreram à mingua. Estas considerações se fazem necessárias para entender com mais precisão o desenvolvimento de Maringá e até mesmo para dar o devido valor aos que superaram as vicissitudes.

São muitas as perguntas sem respostas porque o que se encontra nos compêndios é apenas o produto final de Maringá. Lá está a boa informação. Um filtro na história. Como se a Cidade Canção tivesse chegado ao estágio atual somente por obra e graça de uma leva de homens sérios e trabalhadores cingidos por Deus.


(Livro A história de um cabo de José, de Maria e de todos os Santos, publicado em 2004)

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