terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Livro: "O Jornal do Bispo" - Capítulo 12 - A CURIOSIDADE E A PERSEVERANÇA DE GUMERCINDO CARNIEL

Saído da roça, Gumercindo Carniel nunca tinha visto uma máquina como aquela. Arrumara emprego no novo jornal da cidade como faxineiro. Entre uma varrida e outra ficava observando os técnicos da empresa Tejaner, que tinham vindo do Rio de Janeiro especialmente para colocar em funcionamento a máquina duplex e tubular fabricada nos Estados Unidos. Similar a dos grandes jornais da época, essa era rotativa, ao contrário da plana que existia no O Jornal de Maringá. Na plana, se trabalha com folhas cortadas, os chamados papéis resma. Nesta, eram utilizadas bobinas de até 300 quilos.

O jornal contratou Fioravante Mazão para ser o encarregado das oficinas. O axineiro Gumercindo, curioso e humilde, ficou amigo dos técnicos cariocas e passou a receber instruções sobre o funcionamento do maquinário. Em pouco tempo, deixou a vassoura e passou a trabalhar com Mazão. Quando Joaquim Dutra assumiu o comando da Folha, em 1964, Mazão foi para Curitiba, onde recebeu uma boa oferta para trabalhar de impressor, abrindo vaga para Gumercindo ser o responsável.

Hoje, as redações têm horário para entregar as matérias. Nos anos de 1960 e 1970 não havia um horário limite. Era comum os repórteres ficarem até às 3 da manhã redigindo sobre um evento que havia acontecido à noite. Ocorria, então, a reação em cadeia: a matéria não saia da redação, paravam a diagramação, a composição, as máquinas e a distribuição.

No início da Folha surgiam ainda outros motivos para o atraso. O principal era a queda de energia, o que era corriqueiro em Maringá naqueles tempos. Gumercindo chegava às 21 horas e seu primeiro serviço era acender a caldeira para derreter o chumbo. Se acontecesse de acabar a energia, que levava até duas horas para voltar, o chumbo esfriava e todo o processo teria que ser refeito. Outro problema era a própria rotativa. Se alguma peça emperrava, era difícil saber qual. Era necessária uma checagem quase completa, trabalho que demandava muito tempo. Aos poucos, Gumercindo se tornou um técnico no assunto a tal ponto que, pelo barulho emitido pela locomotiva, ele já sabia onde era o defeito.

Gumercindo já não se recorda da maior parte dos companheiros com quem trabalhou no setor. Recorda-se, além de Mazão, de Antonio Belincanta, Eufrázio e do linotipista Tupã. Diz que o salário não era dos melhores, mas, ao contrário dos demais colegas, preferiu ser registrado na Folha. Nos anos de 1960, o trabalhador não estava conscientizado como hoje da importância do registro em carteira e nem sobre seus direitos trabalhistas.

Entre os fatos marcantes da sua vida na Folha do Norte, Gumercindo se recorda das férias coletivas devido às dificuldades financeiras, quando o jornal chegou a ficar um mês sem circular, em 1964. “Depois de dois anos que começou, o jornal estava com muita dificuldade. Ai veio o seu Joaquim Dutra, arrendou e então tudo mudou. Eu assumi lá no serviço de chefe de oficinas.”
Quando Dutra deixou a Folha e foi montar o O Diário, Gumerciando seguiu o patrão. “Já fui junto. Eu falei com ele: “Seu Joaquim, se o senhor me der um lugar, eu vou”. Aí ficou todo mundo animado porque o O Diário ia trabalhar com off-set. Aí eu fui fazer estágio em Florianópolis.”

Da Folha para o O Diário e daí somente para a aposentadoria. Gumercindo tem Dutra em alta conta e também Frank Silva, a quem considera um grande amigo. Paulista de 82 anos, natural de Presidente Bernardes, Gumerciando veio para trabalhar na roça e ficou quase 40 anos envolvido com rotativas. A sua curiosidade e perseverança o levaram a ser um profissional dos mais qualificados. Guarda fotos da época como troféus para exibir com orgulho e dizer que também faz parte da história da imprensa de Maringá.

Gumercindo, o chefe das oficinas, verifica a impressão
(Foto : arquivo pessoal de Gumercindo Carniel)

Gumercindo Carniel trabalhou 11 anos na Folha e depois foi para O Diário. Só saiu para se aposentar
(Foto: Antonio Roberto de Paula)

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