Com uma Pentax a tiracolo - ou seria uma Canon, uma Olympus? - o fotógrafo folheava o álbum para a mãe. Para convencê-la, ele apresentava um mostruário de fotos de crianças de idades variadas e poses tradicionais. Dizia que o álbum de seus filhos seria entregue em 15 dias e ela só começaria a pagar 30 dias após o recebimento.
Dúvida cruel. Olhava seus três pequenos brincando no quintal, pensava nas contas e ficava preocupada com o marido que sempre reclamava dos seus exageros nas compras. Virava lentamente as páginas do álbum sem prestar atenção nos meninos e meninas quase sem expressão, nada fotogênicos.
Era como se o movimento de virar as páginas colaborasse, lhe desse as forças necessárias para dizer não.Mas o sim era latente. Estava para sair da boca. Ela quase pedia para que o fotógrafo viesse com um argumento irrefutável, definitivo. E veio. Em vez de oito, ele parcelaria em dez vezes.
Queria tanto guardar uma recordação de seus meninos. O tempo passa tão depressa que logo estariam todos longe do quintal e da sua saia. Olhou o caçula ajoelhado, empurrando uma caçamba; o do meio fazendo uma estradinha sobre morrinhos de areia; e o mais velho fincando palitos no chão, cercando um curral. Não pensou mais nas contas, nas broncas do marido e nas dificuldades.
Pegou os meninos pelo braço e levou-os ao banheiro.As crianças não entenderam. Não estava escurecendo, não tinha visitas e não era domingo. Numa tarde, no meio de uma semana, lá estavam eles de banho tomado, cabelos penteados, sapatos limpos e roupas domingueiras. Compreenderam o porquê da quebra de rotina quando tiveram que sentar sérios e empertigados no sofá de courvin vermelho no sistema “escadinha”. Explicando: em seqüência de idade.
Depois, o trio ficou ao lado da televisão Telefunken.Cada disparo da máquina enchia a mãe de orgulho e contentamento. Os meninos, calças com joelhos de fora e camisas de colarinho e mangas curtas, confecções próprias, produzidas pela Vigorelli, grife Mamãe, eram levados da sala para a varanda, onde a Monareta também ia ser fotografada. O pequeno na garupa, o do meio sentado no selim e o mais velho em pé, segurando o guidão.
Da varanda para o quintal, num ângulo mais aberto, com a casa de madeira ao fundo. Outra foto no portão, mais outra... O telefone toca tirando a mãe de uma viagem de várias décadas. Ela atende. É o caçula perguntando das suas dores nas pernas, da pressão. Ela desliga e fica um longo tempo vendo uma fotografia antiga em cima da cômoda. São três meninos num sofá vermelho. Seus eternos meninos.
(Publicado no jornal O Diário do Norte do Paraná em 27 de maio de 2007)
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